OS ZEROIS BRASILEIROS
Um homem invade uma
casa. Não encontra comida. Surra a moradora. Domina-lhe o filho, enfia seu
órgão sexual numa gaveta e tranca com chave. Ateia fogo à casa. Desesperado o
rapaz corta o próprio penis para salvar a vida. Contado assim até parece filme.
Pior que não. É coisa de um dos heróis brasileiros - Lampião, o Rei do Cangaço.
Por 22 anos viveu assim. Ele e seu bando arrasavam vilas, estupravam mulheres,
castravam rapazes, sangravam inocentes em praça pública, marcavam a ferro em
brasa o rosto das moças que se vestiam de forma inconveniente. Poderosos da
região se punham de joelhos implorando verbas federais para o combate aos
cangaceiros. Por baixo dos panos, a conversa era outra: faziam acordo com o
chefe da gangue, vendiam-lhe armas e contratavam seus serviços para eliminar
desafetos. Tutti buona gente. Sertanejos desesperados faziam quilométricas
filas indianas para o sudeste. O latifúndio agradecia e crescia. Por quase três
décadas a antropóloga Luitgarde Cavalcanti pesquisou esse fenômeno. E resultou
no livro A Derradeira gesta: Lampião e Nazarenos guerreando no sertão. Para ela
Lampião viveu 22 anos praticando crimes só porque servia a classe dominante.
Mas os descendentes dos seus coiteiros se sentiam incomodados com essa herança.
No início dos anos 40, deram início a recuperação do nome de Lampião.
Melchiades da Rocha, repórter do A Noite começou a construção do mito no jornal
e seu irmão Melchiades, médico, senador e cordelista fazia sua parte pelo outro
lado. Jogando nas três. Eles eram descendentes de “coiteiros” . Esta new look
do bandido atendia melhor a uma pá de potentados regionais e caía como uma luva
para a propaganda comunista no Brasil, como exemplo de herói camponês. A
Internacional Comunista pensou em recrutá-lo como guerrilheiro revolucionário.
Não deu. Ao fim e ao cabo se contentaram com Dilma, Genoíno, Marighela,
Lamarca... Um dia, quem sabe, vão querer para eles também um lugar de herói.
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